Em algum momento virou o tempo
  um deslizamento
  derramou cimento
  entre a loucura e a razão
  
  Já não há silêncio
  Tudo é barulhento
  Muito movimento
  Pouco pensamento
  Sobra opinião
  
  Todos similares
  Carregam nas mãos seus celulares
  Rostos singulares
  Se tornam vulgares
  Em meio a multidão
  
  Mas eu ainda canto o meu rock n roll
  Eu ainda canto o meu rocknroll
  
  Detritos nos mares
  Nos rios nos lagos
  Todos infestados
  Com enxofre, chumbo e ácido
  O imundo Licor Preto
  
  Garrafas pet
  Cápsulas de Nespresso
  Como espectros
  Durante séculos
  Vagarão boiando pelos oceanos
  Seus esqueletos
  
  Não há nenhum ninho
  Na Grande Ilha de Lixo do Pacífico
  Como um urso-polar flutuando
  Num bloco de gelo
  A beira da extinção
  
  Eu ainda canto o meu rock n roll
  Eu ainda canto o meu rock n roll
  
  Conservadores e liberais
  Usam as redes sociais
  Pra divulgar os seus boçais
  Ideais medievais
  Como se fossem Os Dez Novos Mandamentos
  
  Em presídios superlotados
  Homens trancafiados
  Sendo decapitados
  Seus corações arrancados
  Já não causam mais nenhum
  Estranhamento
  
  Perdeu seu emprego
  Quando revelaram seu segredo
  Morrendo de medo foi crucificado
  Com desprezo como traidor
  
  Mas ele ainda tem o seu rock n roll
  Ele ainda tem o seu rock n roll
  
  Pastores e censores
  Delatores, promotores
  Senadores, corruptores
  Grandes trocas de favores
  Na maior hipocrisia e desfaçatez
  
  As transações tenebrosas
  Das obras portentosas
  Roubam somas vultosas
  Bocas gananciosas
  Esperando cada uma a sua vez
  
  É crime o aborto
  Mas não é o roubo
  De um bilhão
  Por um pacote de biscoitos
  Ele passou mais de 20 anos na prisão
  
  Mas ele ainda tem o seu rock n roll
  Ele ainda tem o seu rock n roll
  
  Todos de vermelho
  Comungam de joelhos
  São fartos em conselhos
  Mas não olham pro espelho
  Evitando o constrangimento
  Da própria contradição
  
  Vaca amarela
  Guardou a panela
  E a camisa amarela
  Saiu da janela
  Onde foi parar aquela balela
  Da fúria e indignação?
  
  Não tenho as certezas
  Dos hinos que grita a multidão
  Mas finco a bandeira do arco-íris
  Viva a liberdade de expressão!
  
  Sertanejo, gospel, hip-hop, choro
  Samba, funk e pagode, rap, rock n roll
  
  A polícia dos costumes
  Chafurdada no estrume
  Manipula o seu cardume
  Acendendo o vagalume
  Aumentando o volume
  Da sirene odiosa da repressão
  
  Com uma mão na Bíblia outra no coldre
  Repetindo seu slogan
  Dente por dente, olho por olho
  Bandido bom, bandido morto
  Parece um contrassenso o argumento que armamento é proteção
  
  Tudo é transgênico no alimento que comemos
  Mas negros, travestis e transgêneros
  São assassinados, humilhados
  E tratados com discriminação
  
  Com eles que eu canto esse rock n roll
  É com eles que eu canto esse rock n roll
  
  Toda nudez é inocente
  Até que a mente indecente
  Dessa gente doente
  De língua maledicente
  Transforme a inocência
  Da nudez da gente
  Somente em perversão
  
  Se Deus fosse consultado
  Qual seria o resultado?
  Escolheria algum dos lados?
  Dos inimigos tresloucados
  Lunáticos, fanáticos
  Por suas crenças ou religião
  
  Uns crêem no Gênesis
  Outros na Teoria da Evolução
  
  Buscando sossego
  Ele lê os gregos
  Hesíodo e Platão
  
  Mas eu ainda tenho o meu rock n roll
  Eu ainda tenho meu rock n roll
  
  Na Primavera
  Me disse a vera
  Eu vou, não me espera
  Abriu-se uma cratera
  Onde havia terra
  Ela era a atmosfera
  E o meu chão
  
  E eu sonho com ela
  Eu preciso dela
  Sou louco por ela
  A vida sem ela
  É incongruência, desolação
  
  O mundo não é mais o mesmo
  Em que eu nasci
  
  Mas eu continuo curando a tristeza
  Com a beleza de uma canção
  
  Por isso ainda canto o meu rock n roll
  
  Eu ainda canto o meu rock n roll
  Eu canto, eu canto o meu rock n roll
  Eu ainda canto, eu canto o meu rock n roll
  E eu ainda canto, eu canto, eu canto o rock n roll
  Eu ainda canto, eu canto, eu canto