Bienal
                          
                               Desmaterializando a obra de arte no fim do milênio
  Faço um quadro com moléculas de hidrogênio
  Fios de pentelho de um velho armênio
  Cuspe de mosca, pão dormido, asa de barata torta
  
  Teu conceito parece, à primeira vista,
  Um barrococó figurativo neo-expressionista
  Com pitadas de arte nouveau pós-surrealista
  Caucado da revalorização da natureza morta
  
  Minha mãe certa vez disse-me um dia,
  Vendo minha obra exposta na galeria,
  "Meu filho, isso é mais estranho que o cu da gia
  E muito mais feio que um hipopótamo insone"
  
  Pra entender um trabalho tão moderno
  É preciso ler o segundo caderno,
  Calcular o produto bruto interno,
  Multiplicar pelo valor das contas de água, luz e telefone,
  Rodopiando na fúria do ciclone,
  Reinvento o céu e o inferno
  
  Minha mãe não entendeu o subtexto
  Da arte desmaterializada no presente contexto
  Reciclando o lixo lá do cesto
  Chego a um resultado estético bacana
  
  Com a graça de Deus e Basquiat
  Nova York, me espere que eu vou já
  Picharei com dendê de vatapá
  Uma psicodélica baiana
  
  Misturarei anáguas de viúva
  Com tampinhas de pepsi e fanta uva
  Um penico com água da última chuva,
  Ampolas de injeção de penicilina
  
  Desmaterializando a matéria
  Com a arte pulsando na artéria
  Boto fogo no gelo da Sibéria
  Faço até cair neve em Teresina
  Com o clarão do raio da silibrina
  Desintegro o poder da bactéria
  
  Com o clarão do raio da silibrina
  Desintegro o poder da bactéria