A Lenda
                          
                               Conta a lenda que dormia
  Uma princesa encantada
  A quem só despertaria
  Um Infante, que viria
  De além do muro da estrada,
  
  Ele tinha que, tentado,
  Vencer o mal e o bem,
  Antes que, já libertado,
  Deixasse o caminho errado
  Por o que à Princesa vem.
  
  A Princesa Adormecida,
  Se espera, dormindo espera.
  Sonha em morte a sua vida,
  E orna-lhe a fronte esquecida,
  Verde, uma grinalda de hera.
  
  Longe o Infante, esforçado,
  Sem saber que intuito tem,
  Rompe o caminho fadado.
  Ele dela ignorado.
  Ela para ele é ninguém.
  
  Mas cada um cumpre o Destino -
  Ela dormindo encantada,
  Ele buscando-a sem tino
  Pelo processo divino
  Que faz existir a estrada.
  
  E, se bem que seja obscuro
  Tudo pela estrada fora,
  E falso, ele vem seguro,
  E, vencendo estrada e muro,
  Chega onde em sono ela mora.
  
  E, inda tonto do que houvera,´
  À cabeça, em maresia,
  Ergue a mão, e encontra hera,
  E vê que ele mesmo era
  A Princesa que dormia.