Dinheiro Em Penca
                          
                               O mati é passo preto
  Ele é muito tapereiro
  Ele canta por amor
  Eu só canto por dinheiro
  No seu canto tem valor
  No meu canto tem vintém
  Ele geme a sua dor
  Eu não choro por ninguém
  Ninguém sabe ir pelo Catumbi
  Ninguém sabe, ninguém sabe
  Eu casei com ela
  Fiz um filho nela
  Bati muito nela
  Fui feliz com ela
  Se o santo cai do andor
  E o barro cobre o ladrilho
  Quem roubou o meu amor
  E me escondeu do meu filho
  Renda de filó
  Carretel de linha
  Jorro de cascata
  Canja de galinha
  Sino de Belém
  Mofo de farinha
  Vou cantar agora
  Uma prenda minha
  O mati ao meio-dia
  Tá piando no soleiro
  Ele canta no estio
  Eu debaixo do chuveiro
  Ele mora no sertão
  Eu no Rio de Janeiro
  Ninguém sabe ir por Andaraí
  Ninguém sabe, ninguém sabe
  Se o peito guarda rancor
  O raio pisca o seu brilho
  Do porto sai o vapor
  Da vaca sai o novilho
  Tem gente que faz favor
  Pamonha é feita de milho
  Quem roubou o meu amor
  E me escondeu do meu filho
  Fé de bisavó
  Praga de madrinha
  Laço de gravata
  Bando de rolinha
  Sorte de repente
  Jura de modinha
  Vou cantar agora
  Uma prenda minha
  Eu fui lá, na grota funda
  Avistar meu feiticeiro
  Fiquei bom do reumatismo
  E ganhei muito dinheiro
  Melhorei do meu cansaço
  E ganhei muito dinheiro
  Ninguém sabe ir pelo Buriti
  Ninguém sabe, ninguém sabe
  Se o cheiro muda de cor
  O nego puxa o gatilho
  A lucidez sai da dor
  O trem de ferro do trilho
  Se o vento liga o motor
  E a morte presta um auxílio
  Quem roubou o meu amor
  E me escondeu do meu filho
  Rede de cipó
  Lata de sardinha
  Porta de alçapão
  Ceva de tainha
  Bolha de sabão
  Sopa de letrinha
  Bucha de balão
  Papo de cozinha
  Meu padrinho quando moço
  Era muito fazendeiro
  Tirou ouro do sertão
  Foi gastar no estrangeiro
  O dinheiro da boiada
  Transferiu pro estrangeiro
  Ninguém sabe ir pelo Piauí
  Ninguém sabe, ninguém sabe
  O avião salta do chão
  O padre sai do retiro
  O acaso faz o ladrão
  Da espingarda parte o tiro
  Do verso nasce a canção
  Do sertão meu estribilho
  Quem roubou o meu amor
  E me escondeu do meu filho
  Medo de ladrão
  Noite de arrepio
  Boca de fogão
  Casco de navio
  Pipa de papel
  Bem-te-vi no cio
  Corda de relógio
  Bomba de pavio
  Tive léguas e mais léguas
  Muito gado, cafezais
  Sesmarias, mata virgem
  Onde a vista já não vai
  Extensão de terra roxa
  Ia até o Paraguai
  Tive até um burro preto
  Que vovô deu pro papai
  Eu também já tive um tio
  Que virou velho gaiteiro
  Que gostava de mulher
  Como eu gosto de dinheiro
  Era louco por mulher
  Eu me amarro no dinheiro
  Fui mascate no sertão
  Caminhei o norte inteiro
  Vendi grampo a prestação
  Guarda-chuva em fevereiro
  Até hoje estou esperando
  A remessa do dinheiro
  O mati é passo preto
  De janeiro até janeiro
  Ele casa no verão
  Eu namoro o ano inteiro
  O mati já tem bisneto
  Eu ainda tô solteiro
  Ele voa em liberdade
  Inda tô no cativeiro
  E voou pra imensidão
  Eu ainda prisioneiro
  Canta curió
  Canta coleirinho
  Sabiá da mata
  Garnizé de ninho
  Terra de niguém
  Viração marinha
  Vou cantar agora uma prenda minha
  Uma vez em Nova York
  Liguei pro meu feiticeiro
  Que atendeu o telefone
  Lá no Rio de Janeiro
  Eu então falei pra ele
  Procurar meu macumbeiro
  Pra avisar pro pai-de-santo
  Pra arranjar algum dinheiro
  Pra pedir pro delegado
  Pra soltar meu curandeiro
  Ao doutor seu delegado
  Pra soltar meu curandeiro
  Mas o tal telefonema
  Lá se foi o meu dinheiro
  Sunga de lagarto
  Dente de galinha
  Sovaco de cobra
  Pena de tainha
  Asa de tatu
  Jura de Maria
  Gritos de menino
  Rabo de Cotia