A Cascavé
                          
                               Tuda vez que ele ia na estação
  E arrecebia carta do Bastião
  Vinha me percurá tão sastisfeito
  Que o pobre do veínho
  Inté garrava um jeito
  De moço que não tem ainda barba na cara
  
  Correndo ele varava a cerca de taquara
  E chegava se rindo
  Me pedindo pra eu lê
  A carta que o fio escreveu
  
  Mais de oito ano sem pará
  Fui eu que leu as carta dele
  Uma por uma
  E vi as tristeza e as alegria
  Que o véio tinha
  Com as notícia que vinha
  Lia pra ele escuitá
  Despois Nhô Gabrié pedia pra eu guardá
  
  Vô lê pra mecêis esta aqui que é a primeira
  O véio inté choro com a brincadeira
  Quár é o pai que qué vê o fio judiado, né?
  Oia só o que o desesperado
  E pobre do rapaz mando dizê!
  
  Meu pai, não posso mais suportá
  Os desaforo do patrão
  Só me chama de tonto e caipirão
  A peste da patroa que parecia sê boa pessoa
  Garrô a me chamá de indige
  E diz que o meu lugá é a mata virge
  
  Tudo essas carta que mecês tão vendo
  Foi chegando, eu fui lendo
  E eu ia lendo, ele ia escuitando
  E as carta que despois de um ano
  O véio me pedia pra mim lê
  Inté dá gosto de vê
  
  É escrevida com letra de jorná
  Pra lê não perciso engarupá os óculos no nariz
  Tem cada uma com cada palavreado
  Que deixava nóis dois atrapaiado
  
  Óia só o que essa aqui diz
  A minha vida é a sombria floresta
  Que o sol do amô mudou numa sala de festa
  Nhô pai! Vô me casá
  Quebrei o compromisso de ficá celibatáro
  Oi só! Celibatáro
  
  Ocêis sabe o que é?
  Se não fosse o boticário
  Nóis dois tamém ficava sem sabe
  É quem fica sortêro inté morrê
  
  Bão! com essa notícia
  O veinho inté canto
  Inté uma bebedêra ele tomo
  Canto pra tudo o povo
  Comprô um sapatão novo
  Um pareio de roupa no Salim
  Nunca vimo ele tão contente anssim
  
  Escuite agora a úrtima carta arrecebida
  Que era mió que fosse consumida
  Acho bão o senhor num vim no casamento
  O povo daqui é luxento
  Deve comparecê pessoa de arta roda
  Que se traje de acordo com a moda
  
  Por isso eu não desejo
  Que a sua absoluta farta de traquejo
  Me deixe envergonhado
  Justamente no dia do noivado
  
  Quando eu cabei de lê
  Ele garrô a tremê, tremê
  Ficô branco, branco
  Se assentô saluçando ali no banco
  Bebeu água e foi-se embora se arrastando
  
  Da janela inda pude vê ele travessando
  Lá a ponte do Corguinho
  No outro dia bem cedinho
  Perto de pau d'aio ali no ataio
  Acharo o pobre esticado
  
  Logo chegô o sub-delegado
  Com dois sordado junto
  Tivero ali vendo o corpo do defundo
  E arguém disse
  Deve de ter sido arguma cascavé
  Que mordeu Nhô Gabrié
  
  (Pedro Paulo Mariano - Santa Maria da Serra-SP)